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Agora a Sério

Um local sério para se falar das coisas sérias de todos os dias. Só para pessoas que se levam muito a sério.

Agora a Sério

Um local sério para se falar das coisas sérias de todos os dias. Só para pessoas que se levam muito a sério.

Ir ao Ginecologista ou o chamado corredor das grávidas

amaralrita, 04.10.19

Já tenho mais de 20 anos, claro que já fui ao Ginecologista.

Geralmente, gosto de ir ao médico de manhã, para depois ir para o trabalho. Ou ao fim-de-semana, de manhã, aquela boa desculpa para tomar o pequeno-almoço fora.

Mas noutro dia, tive de ir ao Ginecologista, de tarde, final do dia, pelas 18h.

Achei que seria igual, um corredor vazio, algumas pessoas à espera, atendimento fácil.

Mas não.

Percebi que ir ao Ginecologista era para ver úteros, mas úteros com pessoas lá dentro vá.

Não era para pessoas como eu que só queriam ver o estado de saúde dos seus ovários.

Ir ao Ginecologista e a outras especialidades é o dia-a-dia das grávidas.

Em plenas 18h, só há grávidas. Ou bebés já cá fora.

Grávidas de poucos meses, acompanhadas pelo pai da criança.

Grávidas com outros dois piolhos atrás (família numerosa merece #MayTheLordHelpThem).

Grávidas com as mãos por cima da barriga, aquele saber-estar que só as Grávidas têm.

Eram grávidas, muitas grávidas.

Coisa que só se poderia haver numa Grávida Parade, não sei.

Foram muitas grávidas ao mesmo tempo. Pois só estou habituada a lidar com uma no meu departamento.

Estar grávida passou a ser normal, a economia agradece (não sei se agradece, mas a família fica contente).

Pronto é isto, vi muitas grávidas no outro dia e não estava à espera. Não há um "como lidar?" é um só "lida-se".

A Ópera da Ranhoca

amaralrita, 08.10.15

ACTO ÚNICO

Cenário: quadro idílico de frio, vento, chuva, não-neve em Lisboa, folhas a cair, croissants de chocolate, cafés quentes, castanhas na rua.

Local: escritório calmo, amplo e escuro, sem sol. Pessoas atarefas, concentradíssimas, focadas, mas com dores de cabeça.

 

Narrador: esta é a história de um paraíso. Com pessoas. Com trabalho. Com sorrisos. Com conversas. Mas sobretudo (pausa) é a história de um paraíso cheio de lenços.

 

Lenços.

Oh.

Lenços.

Lenços de assoar.

Montes e montes de lenços.

Lenços na mala.

Lenços na secretária.

 

E o que trazem esses lenços?

Ranhoca.

A ranhoca verdoca e espessa.

A ranhoca não verdoca mas sim branca de quem tem um nariz que pinga.

A ranhoca não verdoca mas sim branca que fica na secretária com um espirro forte.

 

E o que é que a ranhoca faz?

Entope o nariz.

O nariz vermelho, vermelhaço, vermelhusco, vermelhante, vermelhão.

O nariz vermelho que puxa a ranhoca para dentro para conseguir respirar.

O nariz vermelho que dá comichão e que se limpa com a manga da camisola.

 

E se não dá para respirar pelo nariz, respira-se por onde?

Pela boca.

A boca seca irritada do vento.

A boca seca que tosse e tosse a ver se o pulmão aguenta mais um dia.

Ou então a boca não seca, que não consegue produzir a voz porque tem a mucosa entalada.

A boca entalada pela mucosa que engole a mucosa.

A boca entalada pela mucosa que não engole a mucosa e quer deitar fora.

 

A boca entalada pela mucosa que não engole a mucosa, que quer deitar fora a mucosa e então puxa a mucosa para cima e tenta puxar pelo nariz mas depois deixa de respirar porque o nariz vermelho, vermelhaço, vermelhusco, vermelhante, vermelhão está entupido pela ranhoca verdoca e espessa que fica no lenço em cima da secretária.

Puxa, atrapalha-se, não respira, tosse, sai ranhoca, sai mucosa, entra lenço sujo com ranhoca para absorver mais ranhoca, suja o nariz, limpa o nariz, coça o nariz, espirra, sai ranhoca branca, sai garganta, sai pulmão, sai tripas, sai tudo e DE REPENTE, CORRE-SE PARA A CASA DE BANHO E PUM FECHA-SE A PORTA.

 

Puxa-se o pulmão, a ranhoca sai a custo. Pronto, já acabou a tortura. Limpa-se a boca, as mãos, as mangas, o nariz.

E o sujeito volta à secretária. "Ai que estou a ficar doente".

 

E a tarde cai no escritório mas a sinfonia continua: espirranços, funganços e gargejanços, como uma orquestra em harmonia.

 

Sejam bem-vindos ao Inverno.

 

Pelos caminhos da vida saudável

amaralrita, 15.05.15

No final de 2014, segui o exemplo de toda a gente e fiz a minha lista de resoluções para o Ano Novo. Meti o costume, claro está, e uma daquelas coisas que passava de ano para ano era a "ficar saudável/fazer exercício/emagrecer". Que cliché, mas é o ano novo, vida nova, certo?

Mas este ano eu estava mais motivada do que os anos anteriores e disse a toda a gente que ia a uma nutricionista. Ficou tudo espantado: "Porque é que vais a uma nutricionista? Não podes fazer dieta sozinha? E se for muito complicado? É que eu não consigo ficar sem comer chocolate! Eu não posso/vou deixar a minha torrada de manhã! Uhh, fiquei curiosa depois conta-me como correu".

 

Marquei a minha consulta em Dezembro, pelo que já sabia que em Janeiro começava a sério, que era para passar o Natal tranquilíssima, a comer tudo a que tinha direito porque já sabia que não ia tornar a ver as rabanadas e os chocolates numa próxima era.

Depois das tretas todas de procedimento habitual (pesar, medir, hábitos alimentares, análises sanguíneas) então lá a nutricionista começou a dar-me o plano base super simples e disse as palavras "pão", "tostas", "arroz", "massa".

Pão ao pequeno-almoço, uma fatia grande, com não sei o quê...esperem eu podia comer pão? Mas só podia comer uma fatia ao pequeno-almoço? Uma fatia de pão ao pequeno-almoço? «E não vou ficar com fome?», não, não vais.

Mas a melhor novidade é que eu não só podia comer pão como podia comer pão duas vezes por dia! Sim, eu podia enfardar pão integral de manhã e à tarde. Tá bem, pode ser, e então as frutas? «Só uma por dia, por agora». Então mas eu ia comer pão duas vezes por dia mas só ia comer fruta uma vez? Mas eu estava a ir para uma dieta ou estava a ver se ficava gorda de novo?

 

Bem se eu posso manter o meu pãozinho de manhã, quer dizer que não vai mudar muito, não deve ser muito complicado - pois claro que não, só tens de mudar para um estilo de vida saudável e isso implica tirar uma nova licenciatura para se dominar novos termos, conceitos, ideias, teorias, horários - com tanta coisa nova e articulação de conhecimentos, a ginástica mental está feita, só falta a outra. Ora vejamos:

 

- É melhor comer do que beber: os sumos detox são muito giros mas dar trincas sacia mais. Se querem comer espinafres, levem na tupperware e comam à folha.

- Cortem na manteiga mas não desistam do queijo light. Às fatias, aos triângulos, uma vez por semana, três vezes por dia, fresco nas saladas, derretido, enfim, tornem-se cheese lovers.

- Ninguém diz açúcar: diz-se sacarose, frutose, glicose.

- Comecem a aprender nomes esquisitos: farelo, quinoa, quak, alfarroba, quinoa, tapioca, abacate.

- Quando se diz "leite", não é Ucal: é leite de soja, amêndoa, avelã, aveia, arroz...esqueçam a vaca.

- Fruta em lata não conta como fruta.

- Fruta desidratada naquelas sacas todas da moda também não (snif snif)

- Starbucks nunca - a não ser que peçam café com leite magro e sem pacote de açúcar. Agora é beber cariocas.

- Gelatina vegetal parece ser ainda mais saudável que a normal...pensava eu!

- Iogurtes de soja são piores que iogurte grego magro...o mundo está doido!

- Se acidentalmente colocar açúcar no café, não mexer, para não se dissolver - isto é só truques!

- Comer cenouras em miniatura como lanche da manhã. Vegetais de manhã. Já disse tudo.

- Enfardar em galetes de milho é o meu salva-vidas quando me apetece devorar meio mundo. Tão boas, tão baratas, tão fáceis de comer e deve engordar tanto como a água.

- Poder comer chocolate preto a toda a hora é das melhores notícias do mundo.

- Ir ao supermercado segue um ritual muito fácil que é pegar num produto, ver o rótulo e voltar a colocar na prateleira.

- Lanchar com as amigas é vê-las a escolherem o croissant de nutella e vocês a comerem o pãozinho de cereais.

- Ir almoçar com a família é comer o peixinho e roubar a salada a toda a gente.

 

E esta lista não está nada acabada, porque só levamos cinco meses disto. Quando chegar a um ano até escrevo um livro, sem sumos detox, prometo.