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Agora a Sério

Um local sério para se falar das coisas sérias de todos os dias. Só para pessoas que se levam muito a sério.

Agora a Sério

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O mito da silly season

amaralrita, 05.08.15

Ai, ai, a silly season, aquele fenómeno de passar o mês de Agosto sem fazer nada.

 

É tão bom acordar cedo e montar o farnel para a praia, comer tudo sem horários, fazer a sesta em camas de rede, completar as sopas de letras na hora de almoço, ficar na praia até tarde a comer bolas de berlim, papar todos os livros de romances levezinhos (Nicólas, nunca falhas), passear depois do jantar na marina mais próxima, ver um filmezito em casa com a porta da varanda aberta, adormecer na areia para se ganhar uma corzinha - nada acontece, nada nos chateia, nada nos sobressalta. Até que alguém tem a brilhante ideia de estragar toda esta tranquilidade só porque sim.

Há uns anos, Verão em Portugal era sinónimo de pasmaceira. Até os telejornais não tinham ideias do que anunciar - melhores festivais de peixe, melhores feiras, melhores eventos, melhores festivais, melhores praias, melhores restaurantes, melhores viagens, melhores spots do Algarve, enfim, toda a programação era gravada em 5 dias e depois era só repetir tudo até chegarmos a Setembro. Mas tenho uma novidade - A SILLY SEASON ACABOU. O mundo está crazy e ninguém nos deixa descansar.

 

Isto tudo começou há dois anos, quando tivemos um quase divórcio político. Eu fiquei chocada, acho que perdi uns quantos anos de vida, aquilo foi drama a sério, tão sério que a TVI chorou por não ter pensado numa cena destas para uma das suas novelas. Por acaso houve um final pseudo-feliz mas aquilo deixou o povo em agitação, a bola de berlim já não sabia a tranquilidade e dizer que não se estava preocupado com a situação até parecia sacrilégio.

 

O ano passado ainda estávamos a recuperar da novela e só queríamos ver o Dança com as Estrelas mas alguém saca de mais um drama, mas este era digno de filme: uma família abastada, casas em Cascais, um negócio, um erro, a descoberta do crime, a humilhação pública, o julgamento, a perda do império - até o Coppola ficou com vontade de fazer o Padrinho IV. Foi a pura da loucura, até choveu em Setembro e os jornalistas amaldiçoaram-se por se queixarem de passar o Verão a ver vídeos de gatinhos no Youtube. Ficou tudo tão nervoso que o bronze nem ficou na pele.

 

Eu este ano já estava em contagem decrescente para ver qual seria o acontecimento deste Verão - e os nossos amiguitos das ilhas lá fizeram das suas e o mundo respirou de alívio, íamos ter outro drama este ano e começou logo em Junho, que bom, já temos entretenimento para o Verão inteiro! E iam ser mais episódios, mais acontecimentos, personagens novas, com alcunhas engraçadas, gente maluca da cabeça com camisas horríves e participações especial de grandes actores como a Angela! Aiii que felicidade, como é que eu vivi anos e anos entretida a fazer Sudokus na praia? Isto é mil vezes melhor!

 

Depois destes três anos intensos, o Verão passou a ser a minha estação do ano preferida e já não vivo sem a minha novela anual - só dou uma sugestão, para o ano quero uma cena à Game of Thrones, quero sangue, desmembramentos e desta vez podemos convidar o Putin? Ele é o melhor anfitrião neste tipo de festas e para o ano temos mesmo de aumentar a fasquia. E TVI, desta vez esmera-te na transmissão, porque esta sim vai ser a novela do século!

Meus Queridos Ray-Ban

amaralrita, 08.06.15

Quando uma menina se torna mulher começa a perceber que quer estar sempre na moda, sempre com estilo - e começa então a desenvolver a panca das malas, dos sapatos, dos brincos, dos anéis e, finalmente, dos óculos de sol.

 

Depois de anos a aumentar os lucros da H&M a comprar óculos de sol a seis euros, um verão decidi que me ia tornar numa pessoa adulta, séria, com objectivos de vida ambiciosos: decidi que ia comprar uns Ray-Ban.

Mas isto não é comprar só mais um par de óculos de sol: isto era um investimento mais arriscado do que as acções na Wall Street. Eu ia gastar mais de dois dígitos em duas lentes escuras que iriam cobrir os meus olhos para sempre.

 

O problema disto tudo é que a Rita com 18 anos ainda não tinha a inteligência de hoje - ela era fantástica, certo, mas faltava-lhe a genialidade dos 22 para poder fazer uma compra com pés e cabeça.

Primeiro, embirrou que os escolhidos iam ser uns Ray-Ban Aviator, porque era para parecer cool (coitadinha, já passou);

Depois, quanto maior fossem, melhor (tem um metro e meio mas pensa que tem uma cara gigante, ai ai);

E ainda teve a brilhante ideia de que mais valia comprá-los pela Internet do que comprar numa loja - temos de, porém, fazer a ressalva que a pequenina foi a uma loja, experimentou, apontou o modelo e depois é que foi comprar. Ela não era brilhante mas era inteligente, vá.

 Óbvio que quando os recebeu eles estavam um pouco largos e as lentes escuras e as hastes douradas chamavam demasiado à atenção - afinal, só ia usar de vez em quando. Mas que raio, então andei eu a demorar a comprar uns Ray-Ban para os deixar em casa? Nem pensar!

 

E pronto, lá foi a criança explorar o mundo com uns Ray-Ban na cara. Podia estar nevoeiro, a chover a potes e de noite, mas aquilo não saia da cara. Se estava atrasada para sair de casa mas não levava os óculos, mais valia voltar para trás e perder o autocarro. Era um excelente namorado, lá isso era. Tão bom que ela estava desejosa de os estrear na praia. Já estão a ver bem a cena: mar, areia, sol, selfies com aquele óculão ao pôr-do-sol - oh o problema é que na altura ninguém usava Instagram mas há registos para a eternidade.

 

Mas foi também nesse cenário perfeito que o nosso namoro acabou. Estava eu deitada na toalha, com a cabeça de lado e quero-me levantar e dou um jeito ao pescoço tão grande que enfio a cara na toalha. Quando me levanto, olho em frente e a minha visão tem um risco. OH NÃO. A LENTE ESTÁ RACHADA.

Foi tão grande o salto que dei que fiquei com outro torcicolo. E quis chorar, em desespero. Nem brinquem com coisas sérias que eu fiquei mesmo deprimida. Nem tínhamos comemorado os nossos seis meses. Fiquei de coração partido, isolei-me do mundo e disse que nunca mais ia comprar uns óculos de sol. Eles eram o amor da minha vida, como poderia eu encontrar outra pessoa como eles? Nesse Inverno e nos anos seguintes fui ao cemitério dos óculos de sol (a taça em cima do aquário no escritório) e usei os velhos óculos de sol da H&M. Eu estava de luto e ninguém poderia preencher o vazio daquela partida.

 

Os anos foram passando e eu tive de arranjar outros amigos mas nunca tive a coragem de regressar aos Ray-Ban. Eu não podia comprar outros, outros que não aquele, por isso não valia a pena tentar. Com o tempo, aprendi a amar de novo e a deixar que outros óculos, outros modelos e outras cores me deixassem feliz. Hoje a minha panca por óculos de sol continua acessa mas já não me deixo ser monopolizada. Tenho vários pares para que o amor seja partilhado. Mas no outro dia a saudade bateu, quando uma amiga disse-me "lembras-te dos teus Ray-Ban? Como é que eram? Eu queria uns parecidos".

 

Oh, no que ela se foi lembrar.

Aaaah, o preto das lentes a contrastar com o dourado.

A maneira suave como deslizavam para a minha cara.

Aquele espaçinho por debaixo das lentes em que eu via o mundo metade bronzeado metade normal.

A marca que deixavam no nariz porque eu apertava-os tanto contra mim para não fugirem.

As vezes que eu os puxava para cima para nunca me abandonarem.

 

Hoje estive quase para remendar o meu coração e procurar por outros RayBan mas sinto que ainda não é desta. Sinto que sou feliz como sou e não quero estragar as memórias felizes que passámos juntos. Talvez daqui a um, dois anos, quem sabe, nós possamos encontrarmo-nos de novo e recomeçar a nossa história de amor. Não sei como será o futuro mas se quiserem façam figas comigo, talvez esta história tenha um final feliz.

 

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